Estar há alguns anos no underground nos dá uma cancha de experiencias que vão nos calejando e poucas coisas, no passar de certo tempo, nos surpreende. E sim, quero aqui dizer que sempre há com o que se surpreender, foi isso que vivenciei nesta noite de espetáculo a parte de uma das bandas mais fiéis ao estilo proposto na história do Metal Extremo Mundial, poucas foram tão regulares e tão criativas ao longo dos anos quanto Immolation e isso é puro consenso.
Foi de forma surpreendente que recebi a notícia que a turnê do Immolation passaria por Salvador e fiquei extremamente satisfeito ao saber, rapidamente a notícia foi se espalhando e nós fomos bombardeados com uma série de especulações, pois, até então, apenas Nervochaos era a banda que faria parte do cast, já que, era a banda que acompanhava a turnê do Immolation pelo Brasil. Não distante, imediatamente, eu imaginei, certamente outras pessoas da cidade também, que seria Headhunter D.C. a terceira coluna deste pilar… não deu outra e, sim, foi a Headhunter D.C. lá na abertura desse grandioso evento.
Ao chegar foi possível notar a grande quantidade de gente do lado de fora do espaço, inclusive a velha guarda do Metal Extremo de Salvador muito bem representada, aqueles caras que você não vê há anos e só aparecem em momentos assim, aparentemente, únicos e específicos! Também pude notar a presença de pessoas das cidades do interior da Bahia como Feira de Santana e Alagoinhas, além da cidade de Aracajú capital do Estado de Sergipe, outra cidade relativamente próxima de Salvador. O local, hoje, é um dos mais bem estruturados na cidade em anos para esse tipo de evento e tem um bom respaldo para os moldes da cena como ela se apresenta, ainda carecemos de espaços iguais ou superiores a esse que ofereçam, além de boa acústica, conforto e espaço físico que comporte bem o público.
A primeira banda que sobe ao palco, até de maneira inesperada, acho que ninguém ainda tinha se dado conta que eles estavam já prontos para tocar e nos tomou de assalto com uma música Falling in Perdition do seu terceiro álbum “… and the Sky Turns to Black…” (2000 Mutilation Rec.) numa versão mais curta que a original, segundo Baloff (vocalista), essa versão foi feita especialmente para a introdução do seu setlist que segue com a poderosa Down of Heresy do seu já veterano quinto álbum “…in Unholy Mourning…” (2012 Mutilation). Na sua segunda música, o público começou a se aproximar do palco e quem estava do lado de fora do espaço, também começou a chegar…
Headhunter, como sempre, mostra uma apresentação dinâmica e cheia de energia, contagiando o público e incitando-os a participarem freneticamente, como o verdadeiro culto da morte merece, selvagem e primitivo! Foi uma apresentação, para os que já conhecem, dentro do esperado. Uma questão, talvez, que tenha nos pego de surpresa também, foi a estreia do novo baixista Herácles (Graveren, Putrido Sêmen) em substituição a Leonardo Reis (Behavior, Heretic Execution).
O setlist seguiu com Stillborn Messiah “God´s Spreading Câncer” (2007 Dying Music), …And the Sky Turns to Black… (álbum de título homônimo – 2000 Mutilation), Rise of the Damned (música nova, inclusive o título do próximo álbum), Death Vomit/Am I Crazy? do álbum “Born… Suffer… Die…” (1991 Cogumelo Rec.) que contou com a participação ilustre do ex-guitarrista e fundador da Headhunter D.C. Zé Paulo Lisboa, que fez uma performance memorável relembrando seus velhos tempos de banda em lugar de Tony Assis (que lhe cedeu a guitarra), quando iniciou esse set, a guitarra de Danilo Coimbra teve um pequeno problema e foi rapidamente resolvido a tempo de tocar Am I Crazy… Fechando a noite da apresentação da Headhunter, eles tocaram In Death Metal We Trust (outra música do próximo álbum). Há essa altura, já havia um bom publico dentro da Green House.
Depois de um tempo, sobe ao palco a banda Nervochaos, mostrando uma boa técnica de execução de suas músicas, confesso que não conheço muito bem sua discografia e senti um pouco de dificuldade de identificar as músicas. Seu repertório foi composto por: Necroccult, Demonic Juggernaut, Ritualistic, Pazuzu is Here, Total Satan, Dragged to Hell, Feast of Cain, Shadows of Destruction, Mark of the Beast, For Passion Not Fashion, Moloch Rise, To The Death.
Foi uma apresentação em que se percebeu o esforço dos músicos em conclamar o público, também o fato de ser uma banda veterana e ter vindo a capital baiana outras vezes o que contribuiu para a boa troca com o público presente. Como disse, não conheço bem a discografia e não é uma música que me cativa, mas reconheço o profissionalismo e o respeito que a banda tem com seu público e isso é muito importante no underground.
Com o encerramento da apresentação da Nervochaos, foi a vez da mais esperada da noite: Immolation. Só o fato de podermos presenciar noite tão histórica já estava valendo muito apena, aliás ver de perto músicos que acompanho desde minha adolescência foi algo indescritível, amigos próximos relataram que meus olhos brilhavam, não a toa, sou um colecionador dos lançamentos da banda e não poderia ser diferente diante de algo que nos acompanha na vida toda, praticamente foi uma realização pessoal e creio que tenha sido de muita gente, não só aqui em Salvador como em outras cidades.
Toda Expectativa inicia com a introdução do seu mais recente álbum “Acts of God” (2022 Nuclear Blast) Abandoned seguida da música An Act of God… mal começou e eu já estava em êxtase, em transe, dali pra frente foi difícil ficar assistindo apenas. A cabeça já girava feito hélice de helicóptero, as mãos se erguiam em riste cortando o ar feito varas em chamas, entrei em estágio de total regozijo, foi algo extremamente magnânimo.
Sem pausa começa a introdução de The Distorting Light do fantástico álbum “Atonement” (2017 Nuclear Blast), a essa altura a casa parecia que viria abaixo diante de tanta pressão do público e do contágio da música feita pela banda. A performance do guitarrista Robert Vigna chama muita atenção por ser extremamente peculiar, ele toca seu instrumento como se estivesse flutuando no espaço, como se a guitarra fizesse parte de seu corpo e tocar aquele instrumento fosse algo tão fácil, que nem desse mundo ele era. Immolation mostrou o que é ser uma banda de Death Metal profano e infernal, tocando de um jeito tão perfeito que a sensação que eu tinha, assim como da maior parte do público, é que estávamos ouvindo uma gravação de estúdio tamanha perfeição.
Estou certo que nunca havia presenciado uma apresentação tão perfeita na vida, claro que já vi shows muito bons em todos os aspectos, mas esse superou qualquer experiência anterior, para mim, o que vi neste domingo, foi o divisor de águas entre um excelente show e um bom show!
Estou ainda na segunda música e já descrevi a sensação que tive durante toda a apresentação, pois foi um show muito coeso e constante, o nível de composição deles é muito espetacular, é de uma criatividade e habilidade invejável, não é a toa que é uma das bandas mais influentes no gênero.
As músicas se seguiram com Kingdom of Conspiracy (álbum homônimo de 2013 – Nuclear Balst); Nailed to Gold “Here in After” (1996 Metal Blade) essa hora foi um frenesy coletivo, o público vibrava, aliás, no primeiro acorde foi aquele grito em uníssono que eu queria muito saber como a banda se sentiu com aquela energia emanada por quem estava presente. O set seguiu com Burn with Jesus e Here in After do mesmo álbum de 1996, com a carga energética lá em cima.
Após essa sessão “Here in After” eles voltam ao álbum “Acts of God” com a música The Age of No Light, em seguida A Glorious Epoch do álbum “Majesty and Decay” (2010 Nuclear Blast); uma nova visita ao passado com a introdução e a música Higher Coward “Close to a World Below” (2000 Metal Blade).
Agora chegamos ao auge do show, quando Ross Dolan anuncia, simplesmente, o marco inicial da sua história discográfica, simplesmente Into Everlasting Fire “Dawn of Possession” (1991 R/C Records), e aí? Achou pouco? O que você me diz de Those Left Behind e Internal Decadence? Será que um cara com problema cardíaco, não infarta? Esse setlist estava matador, dilacerante, foi uma das escolhas mais bem feitas para esse tour, com toda certeza.
Ainda tinha bala na agulha e viria a bombástica When the Jackals Come “Atonement” (2017 Nuclear Blast), seguida de No Jesus, No Beast do álbum “Failures for Gods” (1999 Metal Blade) e Apostle do último álbum… foi assim que, aparentemente, o show havia terminado, todo mundo exausto, porém extremamente satisfeitos, tanto público quanto banda isso era notável, visível, mas surpresas ainda estavam guardadas quando o que parecia ser um som de encerramento era introdução para mais uma música: Father e a introdução As the Flames Wept, bom eu não conheço esses sons e por isso cheguei a conclusão de que são músicas novas que estarão em próximo registro deles… acho que eles estão nos devendo uma entrevista… (risos).
Agora seria concluir chovendo no molhado, pois creio já ter gastado todo meu português descrevendo o que vi e senti nesse show, agora é torcer para que outros de tal magnitude passem por aqui e que o Immolation volte logo, que tal ano que vem?
Fotos: Anton Naberius