HORROR TALES – Conto XIII: O Acampamento Macabro no Rio de Janeiro

Horror Tales

Na pequena cidade isolada de Sombra Verde, situada nos subúrbios remotos cariocas, o grupo de amigos formado por dois casais, Marta, Alexandre, Ana e José, buscava um refúgio tranquilo para escapar do caos da capital, tratar seus sintomas de depressão e ansiedade e ter momentos da tão sonhada paz. Então, eles se aventuraram em um acampamento próximo às belas cachoeiras e densas florestas da Mata Atlântica de Sombra Verde, sem suspeitar das terríveis lendas que envolviam o local, conhecidas pelos poucos moradores que viam turistas entrarem na mata para explorar e acampar, mas não voltavam jamais. O sinal de celular, TV a cabo e até mesmo frequências UHF sumiam ou sofriam interferências inexplicáveis naquela região, impedindo qualquer tentativa de comunicação com a civilização ou autoridades da segurança pública.

Marta e Alexandre, mal chegaram ao local escolhido para acampar, decidiram iniciar suas aventuras, explorando as imediações, onde encontraram uma estranha casa gótica, escondida em uma parte mais isolada da floresta, enquanto Ana e José se ocupavam com os preparativos do acampamento. No entanto, uma figura sinistra os observava nas sombras dos arbustos, esperando pacientemente por sua oportunidade. Era Gorr, um ser monstruoso e faminto que tomou gosto por sangue humano após muitos anos atrás devorar e despedaçar duas crianças que adentraram a mata para brincar de esconde-esconde. As crianças eram as únicas filhas de um casal de médicos que estava escrevendo um livro que ironicamente abordava temas relacionados à psicologia infantil aplicada para crianças em contato com a natureza. O casal se separou e desistiu de escrever o livro após o desaparecimento de suas crianças e se mudaram da cidade com suas vidas devastadas por uma tragédia que seria bem maior se eles soubessem como Gorr foi atroz com seus pequenos.

Dentro da misteriosa casa, Marta e Alexandre se viram transportados para uma realidade distorcida, onde o tempo parecia ter parado e a casa pequena por fora tinha o interior de uma grande mansão com diversas portas e luminárias robustas. Nas paredes, quadros com fotos de pessoas sem rostos, eram retratos em locais da floresta e também em frente à famosa cachoeira, que servia de apelo turístico na região, era uma visão assustadora para ambos. Perceberam em um dos cômodos da casa uma vitrola muito antiga tocando uma música enigmática, e isso contribuía para a sensação de inquietude que os envolvia de forma avassaladora. Cada porta que abriam, revelava um novo mistério, quartos vazios sem móveis, outros cômodos com vários chuveiros e várias pias, outro com um piano de cauda da década de 50 sem uma partícula de poeira, parecia ter sido limpo e lustrado minutos antes deles abrirem a porta daquele recinto. Sentiam um misto de curiosidade e medo e a estranha sensação de estarem presos em um labirinto estranho e também macabro. A porta por onde haviam adentrado na casa havia desaparecido então se puseram a procurar a saída com mais velocidade, mas suas investidas eram em vão, ocasionando desespero em ambos. Os espelhos da casa, que eram muitos, não refletiam suas imagens e sombras eram vistas nos espelhos, mas quando eles olhavam para trás, não havia nada de sombras, apenas o ambiente vazio.

Enquanto isso, Ana e José, alheios ao perigo iminente que os cercava, se preparavam para desfrutar da beleza natural ao redor do acampamento, agora, já com barracas montadas e mochilas acondicionadas. Mas o sombrio Gorr, que os observava, tinha outros planos. Silenciosamente, ele se aproximou, emitindo um ar de ameaça que pairava sobre o acampamento. Seus olhos negros, sem nenhuma parte branca, e suas presas trincadas que ocupavam toda a boca que salivava, imaginando qual era o sabor da carne de Ana e José.

À medida que a noite se aproximava sobre Sombra Verde, os destinos dos dois casais se entrelaçavam em uma teia assustadora de horror. Marta e Alexandre lutavam para encontrar uma saída da casa gótica, enquanto Ana e José estavam prestes a enfrentar os perigos que se escondiam nas sombras daquele bosque. E assim, em meio ao isolamento da natureza e às lendas sombrias que permeavam a região, os quatro jovens rapidamente se viram presos em uma luta desesperada pela sobrevivência, onde o mal espreitava em cada sombra e cada suspiro ecoava como um presságio de perigo iminente.

Marta e Alexandre seguiam isolados no interior da casa sombria, que por fora era pequenina e por dentro enorme, cheia de portas e com mobília antiga e exuberante, começaram a encontrar simbologias estranhas riscadas em vermelho nas paredes. O tom do vermelho que viam assemelhava-se a sangue humano, as imagens riscadas eram pentagramas estranhos, e frases de textos curtos, escritos em um idioma que jamais viram ou conheceram. Ruídos estranhos e barulhos de passos entoavam nos ambientes, deixando-os cada vez mais assustados.

Ana e José continuavam na arrumação do acampamento, finalizando detalhes na montagem das barracas, mesmo com o sol já dando sinais que iria embora, se dirigiam para a cachoeira, pois o dia de calor pedia um banho refrescante para ambos que ficaram com a parte pesada do acampamento em suas responsabilidades. Ao mesmo tempo, Marta e Alexandre sentiam o pavor tomar conta de suas mentes ao continuar explorando as entranhas da estranha casa. Descobriram também um sótão coberto de teias de aranha, pensaram que talvez uma saída pelo telhado da casa, seria a solução, mas não havia telhado ou teto após a entrada do sótão. Encontraram uma coleção bizarra de máscaras antigas penduradas nas paredes e um teto que mostrava galáxias em tons de roxo e vermelho. Cada máscara parecia ter sido esculpida para retratar uma expressão de dor e desespero. Intrigados e perturbados, decidiram descer para investigar mais, mas ao descerem as escadas, se viram em um corredor diferente, que não estava lá antes, era mais estreito e escuro do que os outros. Já se sentiam perdidos por completo, sem saber como voltar de tantas portas daquele labirinto infernal.

Um pouco mais tarde, Ana e José, já desfrutavam o frescor tão desejado na cachoeira de Sombra Verde, mas durante seu banho que era para ser de todo agradável, foram surpreendidos por uma serpente venenosa, vermelha e de olhos brancos enormes, como se fosse uma serpente zumbi, que se escondia entre as pedras no entorno da cachoeira. José, em um ato heroico para proteger Ana, acabou sendo picado pela serpente. Desesperada, Ana correu para ajudá-lo, mas durante o tumulto, ela mesma foi mordida pela serpente. Com José inconsciente e Ana debilitada pelo veneno, eles lutaram para retornar ao acampamento em busca de alguma ajuda..

De volta ao acampamento, Ana e José, preocupados com o sumiço de Marta e Alexandre, os celulares de ambos sem sinal, suas mochilas estavam reviradas. Os kits de primeiros socorros, as facas e os canivetes que levaram para alguma adversidade haviam desaparecido. O mais estranho, as garrafas de água mineral que estavam em um canto das barracas, estavam com cor esverdeada como se tivesse criado lodo, mas era um verde bem escuro, ao verificar a água nas garrafas, Ana se pôs a vomitar, pois o cheiro da água era de chorume.

Tentaram também acender uma fogueira para sinalizá-los, mas seus esforços foram em vão. Enquanto Ana cuidava de José, ambos ouviram uma mistura de grito com urro assustador, distante ecoar pela mata escura. Gorr se alimentou e Silas voltou para o interior da casa.

O ar ao redor do acampamento ficou carregado de uma energia nefasta, e Ana e José sentiram um calafrio percorrer suas espinhas.

Enquanto isso, Marta e Alexandre ainda  no interior da casa, que já havia deixado de ser estranha e se tornado maldita, estavam encontrando cada vez mais objetos perturbadores, como bonecas que pareciam ter olhares que os seguiam, e livros antigos com capas de couro que tinham a textura de pele humana desgastada e com feridas de pus seco, as páginas traziam escritos indecifráveis e imagens muito assustadoras, jamais vistas pelo casal. Cenas de sexo bestial de criaturas enormes com pequenas figuras humanas, assassinatos, enforcamentos e torturas brutais, ilustravam aqueles pedaços de papel que pareciam carne escrita com sangue e outros líquidos retirados de vísceras.

Em um lugar da casa ainda não explorado por Alexandre e Marta, estava Silas, o colecionador de almas, figura meio homem, meio fera, que em um passado remoto, quando era apenas homem, tentou decifrar os escritos encontrados na casa da floresta, mas encontrou a morte de sua esposa ainda grávida de poucos meses do seu primeiro filho. Após tocar nos escritos, foi atormentado por vozes que falavam idiomas desconhecidos e se comunicavam por telepatia. Eram entidades sem nome, vindas de outras épocas e dimensões paralelas, seres que visitavam a terra apenas para receber sacrifícios humanos. Ao longo da história, milhares de povos foram extintos através desses sacrifícios, civilizações inteiras foram devoradas e destruídas por esses seres atrozes de poder incalculável e fome insaciável. A tentativa de pronunciar verbalmente seus nomes que ecoavam em telepatia, significava morte instantânea para qualquer humano, mas Silas era uma ferramenta para essas criaturas e nada sofria. Em uma dessas “visitas”, as entidades ficaram presas à terra e Silas foi obrigado a servi-las, em troca de conhecimentos além da imaginação terrena e promessas de eternidade. Gorr era uma espécie de pet das entidades, que observava o cumprimento das ordens dadas a Silas e era alimentado com almas e sangue constantemente para transferir poderes aos seus “donos”.

Silas, naquele dia de aventuras dos dois casais, preparava mais um ritual macabro para oferecer outra alma para Gorr, que, por sua vez, espreitava os feridos desesperados Ana e José na floresta.

Com a lua eclipsada no céu de Sombra Verde, e uma estranha névoa que se mesclou à vegetação, o clima do ambiente estava propício a assustar qualquer um que por ali estivesse. Dentro da casa sem saída, Marta e Alexandre descobriram uma sala secreta oculta atrás de uma estante empoeirada. Lá, encontraram um altar macabro adornado com velas negras, símbolos misteriosos e um odor de carne podre muito forte. Perceberam que de fato estavam em perigo, tentaram desesperadamente mais uma vez encontrar a saída, mas cada porta que abriam parecia levar para outro lugar diferente e mais sinistro ainda.

A noite havia chegado ao em seu ápice de escuridão, sobre a tranquila cidade do subúrbio carioca, trazendo consigo o horror e o desconhecido. E no coração da floresta, trancados naquela casa, Marta e Alexandre lutavam para escapar das garras do mal que os cercava, enquanto Silas, que sentia suas presenças no interior da casa, continuava a servir as vontades das criaturas abissais que habitavam nas sombras e, por telepatia, diziam a Silas que faltava pouco para seu retorno. Que iriam devorar toda a raça humana e destruir outros mundos em outras dimensões com o poder das almas que iriam absorver aqui. O destino dos seis personagens estava entrelaçado em um pesadelo que nenhum deles poderia imaginar. Sem finais felizes, fugas mirabolantes, esperança, fé ou heróis salvadores. Apenas o macabro, sombrio e real horror, que está além da compreensão de suas mentes iludidas por religiões fracas e enganadas por filmes de Hollywood.

De repente, um estrondo ensurdecedor ecoou por toda a floresta, seguido por um silêncio mortal. Quando a estranha névoa se dissipou, todas as figuras, a casa, o acampamento, o vilarejo e a cachoeira haviam desaparecido sem deixar nenhum rastro, deixando para trás apenas o eco de suas últimas vozes desesperadas, as gargalhadas de Silas e os urros selvagens de Gorr.

Em outro lugar da cidade maravilhosa, distante de Sombra Verde, quatro velas se apagaram simultaneamente.

E assim começou o fim de todos nós.

Por: Alexandre Chakal.

Alexandre Chakal é carioca, pai, publicitário, designer, músico, escritor, poeta, locutor, zineiro e editor do blog Metal Reunion Zine há mais de 15 anos.

Aqui, ele se arrisca pela primeira vez a construir um conto de horror.