Thrash Metal parte 12

Brazilian Attack – o ar sombrio, sangrento e aterrador deixado num passado nebuloso

Dark Reflections

Esses artigos foram tomando proporções muito grandes, principalmente depois que fui esmiuçar as histórias e pude perceber a quantidade de bandas que eram importantes ou históricas para o estilo Thrash Metal. Meu projeto inicial dava conta para ser em torno de 6 partes e hoje eu chego ao dobro de partes e ainda não vai terminar aqui com o dobro do que havia projetado. Ainda estou concentrando forças nas duas primeiras décadas, ainda que eu fale de bandas que ainda estão em atividade, minha ênfase são nas décadas de 80 e 90.

A fim de tentar fazer esse mapa do principal eixo do estilo na Europa e Estados Unidos, também procurei destrinchar um pouco o estilo aqui no Brasil e já estou no quarto capítulo, só sobre o Thrash Metal brasileiro, que precisa ser reconhecido como brasileiro a medida que ele vai ganhando contornos próprios e se posicionando de maneira diferente quanto as letras, as influencias e o mercado. Bem verdade que a gigante, não só do Metal extremo brasileiro como o metal de forma geral foi o Sepultura que ocupou esse espaço e não tem como negar sua importância para o Metal brasileiro assim como para o Thrash Metal, sobretudo nos anos 80/90.

De lá dos anos 1980, a cena carioca teve um grande impulso com Dorsal Atlantica, Azul Limão, Metralion e os antecedentes do Explicit Hate: Slaughter e Devastation. Em 1986, Explicit Hate foi fundada através dos irmãos Gus e Rod Santoro, juntamente com o baixista Denilson eles lançaram sua primeira demo no mesmo ano de formação “Ruins of Ambition” contendo seis músicas. Explicit Hate declara que, uma série de bandas que os influenciaram, como: Voivod, Motorhead e Sodom; assim como as bandas de Hardcore europeias como: Discharge e Anti-cimex, ou seja, a nata que dava base ao estilo Thrash Metal.

Certamente que o crescimento da cena no Rio de Janeiro é um fator muito importante e isso faria as bandas se encorajarem, assim como aconteceu com a maioria delas, mesmo que suas carreiras tenham se apresentado de forma curta. Explicit Hate continuou lançando demos em 1987, chegou a lançar duas nesse mesmo ano e no ano seguinte laçaram um dos seus principais materiais até hoje, assim como um material significativo para a cena e a história do Thrash Metal brasileiro “A View of the Other Side”, em 1988, através da gravadora Cogumelo que estava em sua melhor forma na época e estava lançado muitas bandas e muitos materiais que deram um folego espetacular a cena naquela época, mesmo com todas as queixas e falhas, não há como negar o papel importante exercido pela Cogumelo naquele momento.

“A View of the Other Side” é um álbum verdadeiramente de músicas inéditas, pois não reaparecem as músicas de suas demos, além de ser um disco cheio de climas densos, som rústico e muitas vezes muito progressivo. É um álbum com todos aqueles requintes da época que já listei aqui em outros artigos, por sinal com uma produção melhor que muitos outros discos daquela época, apesar das dificuldades técnicas na captação das músicas. A capa do álbum não favorece tanto a música, é de fato um choque de intenções. Eu consigo perceber, apesar de pouca informação sobre a história da banda ou seus bastidores, que o Explicit Hate não foi muito longe com seu primeiro álbum e lembro que a banda Metralion mudou para São Paulo na mesma época para tentar expandir seu nome e estar mais próximo de sua atual gravadora que era a Rock Brigade. De fato, o Explicit Hate era uma banda muito boa e promissora naquele momento, mas seria uma banda que retornaria as demos tapes e isso não era um bom indicativo de carreira para uma banda que já havia dado um grande passo que era lançar um disco. A banda lançou uma nova demo em 1990 “From the Jungle” e finalizou suas atividades no mesmo ano. Dezenove anos mais tarde a banda resolveu retomar a carreira, os irmãos Santoro se juntaram a Alex Kafer (Enterro, Mysteriis, Darkest Hate Warfront, The Troops of Doom) na guitarra e Joel Jr no Baixo para lançar uma promo em 2009, mas não deram continuidade por vários obstáculos e um desses era a falta de suporte ao trabalho da banda, o tempo passou, mas as dificuldades, não! A banda voltou mais uma vez em 2014 e continua em atividade, porém só contou com o relançamento do seu primeiro álbum junto com suas demos compiladas num mesmo material “A View of Every Side” de 2014 (Marquee Records).

Outra banda importante para cena extrema brasileira foi a Paulista Attomica, banda fundada em 1985 na cidade de São José dos Campos. Attomica tinha na sua primeira formação: o guitarrista João Paulo Francis, o baterista Mário Sanefuji, o vocalista Laerte Perr e os irmãos Pyda (guitarra) e André Rod (baixo), aparecem na cena com essa formação em 1986, fazendo alguns shows e divulgando sua primeira demo “Children´s Assassin”. Tudo ia dando certo na banda, shows, turnê para divulgar seu primeiro álbum “Attomica” 1987 (Equinox Records) quando o vocalista Laerte decide deixar a banda.

“Attomica” é um álbum muito Thrash Metal, tem todos os requintes de crueldade e uma barulheira que me lembra muito do “Darkness Descends” do Dark Angel, um som extremamente forte, estridente e sujo evidenciam o trabalho do Attomica, aliás um disco que certamente chegou a beirar o death metal tamanha violência das músicas, mas sim, era um genuíno álbum de Thrash Metal. Em 1989, Attomica lança seu segundo álbum, desta vez pela Cogumelo Records, o “Limits of Insanity”, tendo como vocalista o também baixista André Rod. “Limits…” é um disco de baixa frequência e menos barulhento que o Debut do Attomica, o som já demonstra alguma polidez que talvez não seja a marca do primeiro álbum, mas isso não desqualifica de forma alguma o trabalho da banda que continua ainda muito visceral, mas o vocal de Rod é mais melódico e puxa a banda para uma vertente mais próxima das bandas norte-americanas que primavam pela melodia como Anthrax. No “Limits…” Attomica além de incorporar uma nova linha sonora, acrescenta coro as músicas o que não se percebe também no anterior, bom isso é notável pois a distância de lançamento é muito curta, pouco mais de um ano entre um e outro. Por outro lado, é consideravelmente marcante a troca de integrante ou perda de integrantes e ter de se adaptar a um vocalista que também toca e realmente as composições precisam sofrer adaptações, uma banda precisa reproduzir, nem que seja parcialmente, o que registra num álbum, ao vivo! E por essas e outras, mudar a frequência das músicas faz algum sentido neste caso do Attomica.

Seu terceiro e, provavelmente, mais conhecido álbum é lançado em 1991, também pela Cogumelo sob o título “Disturbing the Noise”, conta com o retorno do vocalista Fabio Moreira, Fabio foi um vocalista que participou da turnê do primeiro álbum substituindo Laerte, mas não ficou até o registro de “Limits…”, neste caso ele vai registrar os vocais no “Disturbing…” e vai entrar na conta de terceiro vocalista diferente na banda. Isso é um tanto complicado, principalmente quando os ouvintes possuem vários registros sonoros diferentes de uma mesma banda, essa identidade fica um pouco confusa e sem tanta solidez quanto, talvez, a banda deseje. Claro que o terceiro álbum do Attomica, como iniciei o parágrafo dizendo, é seu álbum mais conhecido, foi o auge da banda, inclusive levando em consideração a produção de videoclipe e de um merchandise em cima deste lançamento. “Deathraiser” foi a música escolhida para figurar o clipe e tocou na programação da recém-inaugurada no Brasil MTV. Infelizmente, no ano seguinte 1992, a banda encerrou as atividades e retornou em 2002 tendo a Cogumelo relançado o “Disturbing the Noise” em versão CD contendo duas músicas ao vivo como bônus e o videoclipe da época. Em 2004, Attomica lançou um álbum ao vivo “Back and Alive” (Hellion Records) e deu segmento a carreira, porém para lançar novo álbum demorou um pouco mais, seu quarto álbum com o sugestivo título “4” só saiu em 2012, dez anos após a volta da banda, via Oversonic Music. O quinto em 2018, “The Trick” (Marquee Records), seus últimos registros não ganharam críticas favoráveis, fala-se muito das perdas na identidade da banda, principalmente o fato de a formação não ser mais a mesma, apenas Andre Rod ainda resiste daquela banda dos anos 80/90 e aquela apoteose conquistada com o “Disturbing the Noise” não foi mais atingida, fazendo com que a banda perdesse seu destaque, não sua importância, mas o que poderia parecer empolgante é apenas corriqueiro, mais do mesmo!

Mais uma banda que considero importante na história do Thrash Metal no Brasil é o Acid Storm, banda de São Paulo que se formou após o Exterminator ter mudado de nome, ao mesmo tempo que mudou de formação. Acid Storm surgiu em 1989 com a seguinte formação: os guitarristas Marcus Vinicius e Eric Weber, o baixista Chico Comelli, o baterista Alessandro Jannuzzi e o vocalista Robson G., mas essa formação só aconteceu depois que o Exterminator se dissolveu com a saída de dois integrantes: Sergio “Caramelo” (que anteriormente havia tocado no Minotauro) na segunda guitarra, base e solo, e a Patricia no Baixo. Sérgio e Alessandro eram muito amigos e, praticamente, começaram a ouvir música underground juntos, ambos se interessavam por punk rock e hardcore, amigos da escola, Sérgio frequentava a casa de Alessandro para ouvir as bandas e levava muitas fitas cassete, sempre com muitas novidades e isso serviu de influência para que eles criassem o Exterminator em 1987.

Um terceiro amigo em comum lhes apresentou o Thrash Metal do Metalica em seu auge, as bandas de NWOBHM e os deuses do Thrash do diabo Slayer, Exodus, Sodom, Destruction e Kreator que ajudaram a moldar o som do Exterminator, mas, como disse acima a banda acabou perdendo dois dos seus integrantes e aí sim, surge o Acid Storm em 1989. Acid Storm tinha em sua essência o mais puro e genuíno Thrash Metal, seu primeiro registro já foi o EP de doze polegadas chamado “Why?… Dirty War” (R.S.L. Records), lançado no mesmo ano de formação, porém cabe ressaltar que houve no Acid Storm, de fato, apenas uma mudança de nome, já que a base da banda se manteve e, inclusive, as músicas constantes no EP foram herdadas do tempo do Exterminator, também houve uma grande influencia do guitarrista Marcus Vinicius, que era canhoto e fã do Voivod, inserindo sua principal influencia no som do Acid Storm e nas “novas” composições também. Toda essa mistura de influências deram uma cancha muito interessante a banda e isso também os fez entrar rapidamente na cena.

Ao conseguir gravar um disco, ainda que com apenas seis músicas, empolgou bastante os caras e eles tiverem 36 horas para gravar as 6 músicas achando que tinha um tempo infinito, a ingenuidade deles é comovente, quem realmente tem experiencia de estúdio sabe que 36 horas hoje não dá pra gravar duas músicas, mas… eram outros tempos e, em geral as bandas gravavam quase que ao vivo, todos tocando ao mesmo tempo e uma regulagem feita na hora também, enfim, outra realidade. A Acid Storm, até o lançamento do “Why?… Dirty War”, nunca havia tocado ao vivo e isso demorou um pouco a acontecer, apesar de ser uma banda que já aparecia nas páginas das revistas da época, tinha merchandise e um EP de baixo do braço, tocar ou abrir shows de bandas maiores ainda era um sonho, que só começou a se concretizar quando eles passaram a dividir o mesmo empresário da banda Ratos de Porão e tocaram em alguns lugares e até outros estados, Renato Martins (o empresário) os colocou para abrir um show do Ratos no tradicional Dama Xoc e isso colaborou muito para a notoriedade da banda, aliás era muito mais tocar ao vivo e aparecer na mídia que fazia a banda ser mais atraente para o público brasileiro.

Alessandro dava a pinta de ser o principal integrante da Acid Storm, mas a mente por trás das músicas, das temáticas, ou seja, a direção artística da banda era mesmo do Marcus Vinicius, que trabalhou no conceito e nas músicas do primeiro álbum “Biotronic Genesis” 1991 (Heavy Metal Maniac Records). A banda também passou a contar com novos integrantes: Stefano Mollier entrou no baixo em lugar de Chico Comelli (que foi para o MX) e Mario Pastore nos vocais em lugar de Robson G., Stefano também assina a arte da capa do álbum.

Após o lançamento do primeiro álbum a banda se sustentou com essa formação por pouco tempo, ocorreram muitos desentendimentos e, aos poucos, os membros foram deixando a banda até que o próprio Marcus e o Alessandro não seguiram mais com a banda, mas isso não tem uma data específica… também vale ressaltar que a banda chegou a gravar uma demo após o primeiro álbum que seriam as composições novas para um segundo álbum, mas acabou não acontecendo. A banda voltou a ativa, ainda que aparentasse não ter finalizado atividades, mas não teve mais tanta repercussão na cena até cerca de 1997 quando lançaram a terceira demo após o álbum “Biotronic Genesis”, mas seu legado entrou para a história da cena Thrash Metal nacional com esse material dos anos 80/90.

Outra banda que marcou no tempo foi o Hammerhead, apesar da curta carreira e das poucas histórias deixadas pela banda, podemos sim, pontuar o seu álbum “Shadow of a Time to Be” 1992 (DGK Comercio e Representações Ltda.). É um disco cheio de influência da Bay Area e, posso afirmar que é um material que até destoa da tradição do estilo no Brasil, mas não deixa de ser um disco muito bem-feito, correto e tradicional, só não segue o feeling das bandas nacionais e tem sua visão totalmente voltada para a cena estrangeira o que acabou por fazer a banda ser mais do mesmo. Hammerhead foi formada em 1987 em São Bernardo do Campo/SP e só lançou uma demo e este álbum. A formação que gravou a demo contava com Fernando (Vocais), Armando Junion (Bateria), Eduardo (Guitarra), Luís César (Guitarra solo) e Thomas Wisiak (Baixo), já o álbum contou com um quarteto sem o Thomas, Fernando assumindo o baixo e Luís assume o vocal além da guitarra. A banda voltou a lançar seu primeiro álbum na versão CD, com capa diferente através do selo Voice Music em 2008 contando com faixas bônus ao vivo e a demo de 1988 “Bring the Hammer Down”.

Outra banda que também ficou em um grande registro foi a Antítese, banda de Osasco/SP que lançou sua primeira demo em 1988, mas a banda foi formada em 1986. Na demo consta a seguinte formação: Binho (Baixo), Laércio Jr. (Guitarra), Rogério          (Bateria), Daniel (Guitarra e Vocal) falecido em 2020; seu grande registro foi o álbum “Antístese” lançado em 1989 lançado pela Pulsar Rock Discos, o mesmo foi relançado em 2022 pelo selo Rapture Records, numa versão especial em CD para colecionador. Antítese, diferente do Hammerhead, já tem uma sonoridade mais genuinamente brasileira por flertar fortemente com o Death Meta e isso era uma marca das bandas de Thrash Metal daqui, Antítese tem um som muito robusto em seu álbum, mostrando criatividade, coesão e muita inspiração. Aquela selvageria sonora em pleno final dos anos 80 era uma das coisas mais incríveis que poderíamos ter, afinal estávamos com algumas bandas muito importantes figurando a cena e fazendo um material muito histórico como Antítese, MX, Acid Storm, Avalon, Metralion e outras que marcaram o underground brasileiro.

Infelizmente, eu tenho pouco ou quase nada as informações sobre a banda, o fato é que a banda lançou apenas uma demo e o álbum assim como o Hammerhead, porém seu legado aqui deixado se tornou muito importante para influenciar as bandas que viriam mais a frente, não necessariamente nos anos 90 que foram muito ruins para o Thrash Metal no geral, os anos 90 foram os anos dourados do Black e do Death Metal assim como o Doom Metal também ganhou muito terreno e o underground, não apenas no Brasil, mas no eixo internacional, esteve com os olhos muito voltados para o submundo da música pesada e o Thrash perdeu terreno, criatividade, inovação. Bom, aqui já foi largamente debatido a questão do mainstream, assim como também já mencionei o que ocorreu de fato no underground nos anos 1990, isso fez com que a cena thrash metal no Brasil estagnasse e aparecesse bandas com pouca expressão. Vale ressaltar que algumas bandas aqui não foram citadas como Warhate ou Siecrist, por serem bandas que possuem um misto em sua sonoridade que não torna a banda puramente Thrash Metal e nem os próprios as enxergavam assim, puramente Thrash Metal, porém eu as trarei em algum capítulo da série que achar adequação para inseri-las nesses textos. Para fechar o artigo de hoje fica aqui minha lista de recomendações e até a próxima parte da série.

Lista de Recomendações:

Explicit Hate – “A View of the Other Side” 1988 (Cogumelo Records)

Attomica – “Attomica” 1987 (Equinox Records)

Attomica – Limits of Insanity” 1989 (Cogumelo Records)

Attomica – “Disturbing the Noise” 1991 (Cogumelo Records)

Acid Storm – “Why?… Dirty War” 1989 (R.S.L. Records)

Acid Storm – “Biotronic Genesis” 1991 (Heavy Metal Maniac Records)

Hammerhead – “Shadow of a Time to Be” 1992 (DGK Comercio e Representações Ltda.)

Antítese – “Antítese” 1989 (Pulsar Rock Discos)

Referencias desse capítulo:

https://metalnalata.com.br/entrevista-com-alessandro-jannuzzi/ consultado em 06/04/2024

https://www.last.fm/pt/music/Acid+Storm/+wiki consultado em 05/04/2024