TURVO ZINE – Atmosfera dos primórdios dos fanzines dos anos 70 e 80

Entrevista

Em se tratando de imprensa underground, os zine e os flyers serão sempre o inicio de tudo, de uma divulgação ampla, mas direcionada. E nada melhor que conversar com um dos zineiros da velha guarda dos fanzines, e nesta conversa o amigo Tadeu Ricardo, editor do Turvo Zine e também já colaborou com outras publicações, atualmente agregou ao currículo O Noctâmbulo Zine o selo De Profundis Prod.

Confiram a seguir as palavras do Crow.

E aí meu amigo Tadeu Crow (aliás, hoje você não usa mais este pseudo, hihi) como tá essa força! Mah, o Turvo Zine é um dos zines mais antigos da cena e que ainda persiste no velho formato xerox e no D.I.Y., houve um hiato aí nessa jornada, por qual motivo se deu este hiato e também como se sucedeu o retorno.

Tadeu: Salve Zartan! É sempre um prazer extremo poder bater um papo contigo meu velho. Obrigado pela oportunidade. Cara, “Crow”. Esse pseudo usei muito lá em meados de 90, tempos das correspondências… hoje até fico surpreso quando alguém me lembra do mesmo. Foram tempos muito loucos e de muitas ideias fervilhando na mente. Eu vou seguindo nas labutas diárias. Filhos, trabalho, responsabilidades… toda aquela rotina que você também conhece muito bem. Depois que eu lancei a quarta edição do zine eu já estava tendo muitas responsabilidades e tive que priorizar outras coisas na época como o nascimento de minha primeira filha entre outras situações. Eu estava ficando sem tempo para continuar me dedicando ao Turvo então decide parar. Pensava um dia em trazê-lo de volta, mas não imaginava quando até que anos depois trocando umas ideias com o Nephasthorm ele tocou no assunto. Na época estávamos envolvidos no projeto de um outro zine, o Resistência Opositora juntamente com o Guga Burkhardt e André Deliver (Zine esse que só teve uma edição) e então Nephasthorm me abordou com relação a possibilidade de voltar a editar o Turvo. A princípio não demonstrei interesse, mas acabei trazendo-o de volta quando lancei a edição de retorno, a número cinco em 2020.

No início era mais bruto a coisa, tudo datilografado e com recortes + cola e tudo cuidadosamente organizado dando assim uma excelente experiencia de leitura, hoje em dia, com o adento das “facilidades” (assim digamos) da modernidade, não houve interesse em atualizar o formato do Turvo Zine para um zine mais profissional e no formato impresso, quem sabe o mesmo vim a se tornar uma revista. O Turvo Zine tem pretensão de um dia vim a ter uma versão digital/site do mesmo?

Tadeu: Apesar do Turvo nas suas quatro primeiras edições ter sido totalmente datilografado, eu já tive a experiência em fazer um Zine todo digitado anteriormente. O As Leituras do Corvo foi meu primeiro fanzine como tú sabes e ele era digitado pois aproveitava as horas de almoço na empresa de vigilância em que trabalhava na época para digitar os textos no computador. Era meio desorganizado, não sabia mexer direito com Word, Excel, mas deu certo. Com o Turvo eu queria aquela atmosfera dos primórdios, dos fanzines dos anos 70 e 80 com aquela estética suja do Punk também, tinha que ser datilografado. Comprei uma máquina de escrever Olivett na época de minha encarregada na empresa, aquele modelo monstruoso e pesado e meti a cara pra criar o Turvo. Voltar a editar o mesmo digitado não foi algo muito complicado e confesso que com os recursos tecnológicos de hoje fica mais fácil e rápido fazer o Turvo. Em se tornar uma revista? Não cara, isso nunca me passou pela cabeça e nem divulgar o mesmo como webzine não é do meu interesse. Prefiro manter o mesmo nessa estética impressa.  Eu não tenho nada contra qualquer outra forma de divulgação, o Underground tem que ser propagado por todos os meios isso é fato, mas com o Turvo esse esquema não vai acontecer.

Agora você mexeu num passado tortuoso (risos), editar zines era complicado, eu mesmo usava o PC do trampo, e o pior, era diagramar, imprimir e apagar, visto que na época num podia deixar provas do crime (risos), eram dias complicados, esses sim foram dias de perseguição e sim, de opressão contra o movimento underground rock/metal. Ai me vem à mente aquele ditado “no meu tempo era diferente”, aproveitando o ensejo, comente ai as edições zineiras/revistas que tem acompanhado/adquirido e que posso nos indicar a conhecer.

Tadeu: Hehehe… velho eu como não tinha a manha de mexer com bordas e margens no computador era meio que na tora mesmo! Eu digitava os textos, depois mandava para impressora para depois recortar as xerox das fotos das bandas pra fazer toda aquela montagem. Como não sabia fazer a diagramação no próprio PC eu fazia direto com colagens também.  Cara, eu costumo dizer que àqueles primórdios eram tempos de guerrilha, até andar de coturno era meio que visto com olhos tortos pelas pessoas. Hoje ninguém vai estranhar vê um cara todo de preto com camisas de bandas, calças rasgadas e coturnos andando nas ruas a noite, mas naquela época isso impactava. Lembro das madrugadas de chapação vindo dos shows do Recife antigo esperando os bacurais na avenida Dantas Barreto ou na Conde da Boa vista pra poder voltar pra casa.  A gente passava por muitas presepadas, quando não eram os assaltos eram as vezes as abordagens da PM nas madrugadas, eram outros tempos.

ZArtan, tem muito Zine fod@ sendo editado na cena nacional, alguns das antigas ainda em atividade, Fly Kyntal do amigo Sérgio Figueiredo, o Acclamatur do Guga Burkhardt, outros Fanzines muito bons e ricos em informação como o Akkeldama do Tiago Siqueira, o Death Metal Zine do Andrey, os diversos zines lançados pelo Nephasthorm e o amigo Rikärdo Chakal. Posso indicar ainda o Sepulchral Voice do André, o The Old Coffin Spirit do Fábio Brayner, o Crush Of The Cross do Samir, o Morte aos falsos do Bruno Seixas, dentre tantos outros como Seraph Zine, O Combatente, Dreamaker… e tantos outros zines bons que me fogem a memória no momento. O Brasil sempre teve uma imprensa Underground muito ativa e forte!

Fale um pouco acerca de sua trajetória no underground, além do Turvo, quais outras publicações você editou ou participou. Como nasceu a ideia do Turvo Zine.

Tadeu: Editei o As Leituras do Corvo que foi meu primeiro Fanzine. 12 edições em menos de 3 anos! Não sei como eu consegui fazer aquilo na época porque até os custos com xerox eram caros. Tirava poucas cópias das edições. O gozado é que não tenho nem mais as matrizes daquele Zine. Teve também o The Lady Vanishes, esse foi uma publicação totalmente voltada para subcultura gótica da qual sempre foi muito admirador também principalmente da essência e atmosfera do gênero dos anos 80. Tentei reunir no Zine poesia, literatura e a música relacionada ao universo gótico. Só cheguei a lançar quatro edições. Participei da criação do Resistência Opositora Zine em parceria onde lançamos uma edição. O Guga Burkhardt a um tempo atrás cogitou de editarmos a segunda edição, mas a ideia só ficou no projeto mesmo. Não sei se mais pra frente venha acontecer, o tempo vai dizer e disponibilidade de cada um também. E hoje além do Turvo também edito o “Noctâmbulo”. Fanzine de cunho sobrenatural, ficção e horror. Era um trabalho que tinha em mente fazer no passado, mas só consegui dar forma ao mesmo agora. É um Zine de leitura rápida mais com um conteúdo bastante rico. Sobre a ideia da criação do Turvo foi o que mencionei, queria fazer um Zine nos moldes dos primeiros fanzines. Voltado para divulgação do Underground e com aquela estética. Uma influência muito grande pra criação do mesmo também foi a cena Underground de Recife que em meados de 90 e idos de 2000 estava a todo vapor por aqui!!! Muitas bandas fodas, algumas não estão nem mais ativas. Saudosos points como o Francis Drinks Bar, Bar do Grego, Sucata, Bar Underground, Pocoloco, Cantina Z4, Circo Maluco blz, Teatro Maurício de Nassau, o Dokas, Bomber dentre tantos outros locais fodas que abrigaram a cena Underground de Recife. Todo esse cenário também foi inspiração

Sim, o Noctâmbulo é um baita zine mah, um seguimento bem interessante, creio que na mesma linha há poucos zines, me vem à mente o Juvenatriz do amigo Renato Rossati. Voltado a este seguimento, que publicações e filmes nos indicariam a conhecermos?

Tadeu: A abordagem para o Noctâmbulo eu queria que soasse diferente dos Zines tradicionais que abordam música e tal. Nesse trabalho eu quis me aprofundar nesse universo lutuoso que tudo tem a ver com o Metal pois é inspiração para o mesmo. Mas nesse trampo foquei mais no conceito literário em si, que alimenta e fascina o imaginário dos adeptos de assuntos ocultistas, ficção, sobrenatural e horror. Tem muita inspiração boa para esse Zine que também indico a procurarem conhecer, desde a literatura e poesia maldita de Baudelaire, Poe, Augusto dos Anjos passando pelo ocultismo de Papus, pelo mundo cinematográfico que vem das obras de terror e suspense das produções da antiga Hammer e de cineastas como Alfred Hitchcock, as obras de Anne Rice, Sidney Sheldon, William P., Blatty… o Noctâmbulo é um Fanzine moldado partir dessas inspirações.

Algo interessante é que o Turvo Zine nasceu como a reformulação do as Leituras do Corvo Zine, como foi essa mudança.

Tadeu: O As Leituras tinha tanto aquela parte poética e literária como também a parte focada na música e na cena.  No Turvo decide manter o foco no cenário, na música extrema. Em quanto essa parte mais poética introduzi no The Lady Vanishes.

Em matéria de entrevistas, como é feito a seleção para o set que comporá as páginas do zine? Você costuma receber material para resenhar ou há uma cota destinada para a aquisição de itens.

Tadeu: Na edição atual eu extrapolei um pouco na quantidade de entrevistas. A mesma acabou ficando um pouco grande o que está acarretando num gasto maior para imprimir. Tento dá uma controlada na quantidade de perguntas, mas a casos em que isso é impossível pois as entrevistas que pedem um pouco mais de abordagem sobre a banda. A exemplos do Oligarquia, Insanitears e do Éter Zine na edição mais recente onde as conversas foram mais prolongadas. A parte de resenhas é a parte que mais detesto fazer. Não sou crítico e dá uma tremenda dor de cabeça fazer as mesmas kkkkk… A maioria dos materiais que resenho são os que adquiro.  Alguns recebo das bandas. E há casos quando não tenho o CD recorro as bandas para enviar os áudios.

Como você avalia a atual “modernização” da imprensa underground, digo, hoje existem muitos veículos que divulgam a cena, vide web rádios, sites, podcasts e afins e de diversos estilos musicais.

Tadeu: Pra mim tudo isso é ótimo no que diz respeito a tratar de difundir informação. Você não vai encontrar o submundo das cenas em revistas e sites do mainstrem. Então se o Underground está tendo vasão além do Zines impressos através de webzines, weberadios e blogs acho isso positivo pra mesma. Não tenho nada contra isso, pelo contrário sou a favor.

Atualmente você também enveredou pelo submundo underground de lançamentos e distribuição de material underground, criando o selo Deprofundis Prod/Recs/Distro.

Tadeu: A De Profundis Productions era algo que almejava a anos. Hoje tudo está sendo possível acontecer devido uma forte parceria que tenho com minha sócia Rosiane Guedes. Inicialmente éramos três no comando, mas depois de diversos percalços somos só os dois no andamento da mesma. A estreia do selo foi com o lançamento do Full da Final Creation, banda de amigos de longas datas e que acreditaram no nosso trabalho. Estamos verdes ainda, mas com um intuito muito grande de fortalecer mais o Underground. Alinhando parcerias chegamos pra somar junto aos demais selos, distros e gravadoras de responsa que estão em atividade dentro da cena nacional fazendo trabalhos sérios pela mesma.

O selo tem também organizado eventos, como estão as atividades deste seguimento pós pandemia?

Tadeu: Temos o nosso evento anual que é a “ExpoFest Underground Hellcife”. Já realizamos três edições e estamos arquitetando a desse ano que irá se realizar em novembro. Após a primeira edição em 2019 com aquele caos que foi gerado com o surgimento da pandemia de Covid pensávamos que não conseguiríamos realizar o evento novamente, estava tudo muito tenso e preocupante e não tínhamos a mínima ideia de quando isso iria passar. Mas quando o contágio foi controlado e começou a flexibilidade das normas de proteção vimos a possibilidade de concretizar o evento novamente. Não é fácil enveredar por essa área de shows como você bem sabe. Requer tempo, toda uma organização e gastos! Teve momentos em que pensei até em desistir. Se não fosse a insistência de minha sócia acho que não teríamos passado da segunda edição. O número de shows Underground também aumentou após a pandemia e meio que você tem que acertar numa data certa para realizar o seu. São muitos um encima do outro e isso acaba prejudicando um pouco. Mas estamos otimistas com a edição desse ano.

Se não me falha a memória, você chegou a participar/organizar uma feira underground divulgando a cultura zineira underground, o que podes falar acerca deste evento.

Tadeu: Na verdade foi a primeira edição do nosso evento onde reunimos Distros, artesãs, comerciantes, ilustradores, zineiros, estamparia… esse é o foco do evento até  hoje, o de dá espaço a esse tipo de segmento dentro da cena, mostrar que a mesma não é feita apenas de shows e bandas mas de muita gente fazendo as engrenagens da cultura Underground girarem.

Meu amigo, Tadeu, agradeço imensamente o tempo e o bate-papo, deixo este espao para algo mais que o amigo queira relatar.

Tadeu: Cara obrigado pelo convite para participar do Portal Lucifer Rex, grande veículo de divulgação do Necrounderground nacional onde tenho a oportunidade de falar um pouco do meu trabalho. Extremo abraço meu amigo a você e todos que fazem o portal, propaguem o caos!!!! Propaguem a cena extrema nacional e todos aqueles que movimentam a mesma; bandas, Zines, revistas, rádios, web rádios, produtoras, selos, Distros, lojistas, ilustradores, artesãos, todos que fazem essa porr@ acontecer!!!!

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